sábado, 18 de abril de 2009

As Nuvens

http://www.youtube.com/watch?v=aXTLhjbTU0c


Quando eu parti, Manágua estava envolvida por uma densa neblina. Era 12 de fevereiro, muito estranho para essa época do ano. Aliás, para qualquer época do ano. Em Manágua nunca tem neblina. Era uma forma de despedida, a única que talvez a cidade encontrasse para me despedir. A poucos quilômetros de Manágua há um lugar chamado “As nuvens”, também conhecido como "El Crucero" (O Cruzeiro) uma pequena localidade, na serra, onde o clima muda radicalmente. Esse contraste com o clima, a que eu estava acostumado, de Manágua, sempre me fascinou e estimulou minhas fantasias infantis.
A cidade quente que é Manágua vira do avesso. O mais incrível é que essa localidade é de pequena extensão e se encontra no meio caminho para o mar. A gente sobe desde Manágua, numa estrada com muitas curvas, e quando se chega lá, tudo é engolido por uma densa neblina que impede enxergar além de um metro, os carros reduzem a velocidade, as pessoas, e eu achava isso maravilhoso, caminham com abrigos, jaquetas, roupas grossas, um vestuário impensável para Manágua.
Na medida em que se avança, em direção ao mar, a neblina se desmancha, o sol brinca e desfaz com seus raios, aquela enorme cortina branca, e se inicia a veloz descida, as curvas surgem de repente, contínuas, intermináveis, traiçoeiras. Sempre achei essa estrada misteriosa e perigosa, quando menino eu tremia, olhava aquela estreita faixa de asfalto, e a um lado e ao outro, enormes precipícios. Ao lado direito, o precipício imenso terminava no mar que brilhava, lá no fundo, me esperando.
Aquele dia em que eu parti as nuvens tinham descido a Manágua, para uma alegre e triste despedida. Por um momento duvidei, quis voltar, mas não consegui, algo me impulsionava, caminhei mecanicamente, me despedi, do avião olhei a cidade, ao seu lago cinzento sempre fiel, tristemente fiel, as nuvens tinham desaparecido, o sol brilhava de novo esquentando as ruas e os tetos, a catedral parecia indiferente, por última vez vi a praça, as tartarugas e o Jacaré, não vi as preguiças, mas com certeza dormitavam aferradas aos galhos das enormes e velhas árvores, vi o quiosque vazio onde eu gritava para ouvir meu próprio eco e os trilhos do trem que nunca mais passou.
Não sei se ela me mandou embora, não sei se eu a abandonei. Mas numa promessa muda eu sabia que voltaria, ela me esperaria como Penélope, eu de novo sentiria seu calor, adivinharia nos seus olhos a felicidade ressurgida, nas minhas mãos, descobriria de novo, as caricias esquecidas.

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